Obras

Modos de Habitar

Modos de Habitar
Ways of Dwelling
2016-2018

Fotomontagem a partir fotografias de Georges Leuzinger, Marc Ferrez e fragmentos de Augusto Stahl
Photomontage based on photographs by Georges Leuzinger, Marc Ferrez and details by Augusto Stahl
Tríptico | Triptych

Vista do bairro portuário da Gamboa, c. 1865, Rio de JaneiroView of the harbor in Gamboa, c. 1865, Rio de Janeiro
Georges Leuzinger/Acervo Instituto Moreira Salles

Louis Agassiz Photographic Collection/Série “Raça Pura, “Pure Race” Series, c. 1865
Peabody Museum of Archaeology & Ethnography, Harvard University

Baía de Guanabara, c. 1885 Paquetá, Rio de JaneiroGuanabara Bay, c. 1885, Paquetá, Rio de Janeiro
Marc Ferrez/Coleção Gilberto Ferrez/Acervo Instituto Moreira Salles

Louis Agassiz Photographic Collection/Série “Raça Pura, “Pure Race” Series, c. 1865
Peabody Museum of Archaeology & Ethnography, Harvard University

Arquipélago de Anavilhanas, Amazonas, 2017/autoria das artistas Anavilhanas archipelago, Amazon, 2017/image by the artists Louis Agassiz Photographic Collection/Série “Raça Pura, “Pure Race” Series, c. 1865
Peabody Museum of Archaeology & Ethnography, Harvard University

O mar, na cosmologia Bantu, também conhecido como Kalunga, era considerado o local dos ancestrais. De fato, um dos mitos transmitidos através das gerações descendentes dos escravizados, foi que, quando embarcaram nos navios na África, pensava-se que iriam encontrar os antepassados do outro lado do mar. 

Nesta série usamos fotografias da região portuária do Rio e imagens de pedras na Baía de Guanabara no século 19, a paisagem vista pelos milhares de escravizados assim que chegavam ao porto. Uma imagem de uma mulher grávida, paira sobre a paisagem de chegada no Rio de Janeiro, ela carregando uma filha que flutua no líquido amniótico dentro do corpo. O mar simboliza a água dos ancestrais, e o futuro é simbolizado pelo líquido amniótico. A figura paira sobre a paisagem do porto do rio de janeiro e suas águas tais como vistas no século 19, época em que a memória do cemitério de escravizados na Gamboa ainda existia. A terceira imagem é de uma árvore que cresce dentro da água à beira de um rio, simbolizando as raízes que perduram, resistem e florescem mesmo sobre o solo movediço  do meio aquático. 

O cemitério dos Pretos Novos, onde este trabalho foi exposto pela primeira vez, era localizado muito próximo ao Cais do Valongo, conhecido por ser o maior local de chegada de escravizados no mundo durante o seu funcionamento entre 1799 e 1842, o que coincide igualmente com o período de funcionamento do Cemitério dos Pretos Novos (1799-1835) e o período de maior intesificação do tráfico de escravizados na história mundial.

Do porto eram levados os corpos daqueles que não resistiram a travessia transatlântica para este cemitério, sendo este trajeto aquele que aparece na imagem do porto tirada por Marc Ferrez desde o Morro da Saúde em 1885. Na imagem central, nos aproximamos de uma possível visão do porto de chegada com as pedras da Baía de Guanabara, próximos à ilha de Paquetá, significando o início da etapa brasileira da travessia. 

O cemitério é considerado por muitos o ponto mais próximo da África em solo brasileiro por ali conter corpos de africanos natos libertos, que teriam sido escravizados pouco tempo antes de sua morte após a travessia. Como muitos dos corpos neste cemitério de escravos nunca receberam rituais de enterro apropriados à sua religião e seus costumes de origem, suas almas são consideradas a flutuar até que possam reunir-se com seus antepassados.